quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

IICronica publicada no Jornal o As.

Contou-me um dia um amigo meu que na sua carreira de treinador a situação mais caricata que lhe tinha sucedido foi um miúdo pedir-lhe para lhe limpar o rabiosque, que na sua tenra idade e após o alívio antes do jogo começar (fruto do tal nervoso miudinho que faz a tripa dar a volta) não tinha tido tempo para chamar a mãe que nervosamente aguardava a saída do seu Ronaldo para a estreia num campo de futebol. Os treinadores das camadas jovens são os parentes pobres do nosso meio. Sem os holofotes da fama, das rádios, dos jornais, fazem tantas vezes de pais, de tutores, de formadores e de confidentes, de “professores” que ensinam não só a arte do pontapé na chicha mas também transmitem as regras básicas da conduta desportiva, do trabalho em equipa, do à vontade para tomar banho mostrando o pirilau ao menino do lado, sem ter medo de ser gozado por ter a “arma” mais pequena, gorda ou feia que o vizinho. Convivem os treinadores de futebol juvenil também com outra área fundamental: os paizinhos! Desde sempre os houve, desde sempre os haverá, e são por vezes um grande apoio aos treinadores na ajuda em toda a formação cívica de HOMENS que falámos atrás. Porém, outras vezes, são o grande problema! Para um pai o seu filho é sempre o melhor, seja a jogar, seja a cantar, seja a desenhar, seja a urinar com o arquinho mais alto, seja a mandar o piropo mais giro à empregada do café da esquina ou tão simplesmente a gozar com o amigo que é lagarto e não ganha a ninguém. Não se preocupa em que o filho pratique desporto em vez de andar na má vida, nem tão pouco lhe passa os valores de que nem sempre se pode ganhar, jogar, que nem sempre se tem de culpar o árbitro pela derrota, ou que terá de respeitar o vencedor da mesma forma que o deve fazer ao vencido quando ganha. Preocupa-se em que o filho jogue sempre! E quando não o faz o burro é o treinador! Não importa se do outro lado estão miúdos maiores, já com barba, que em 3 passadas “papam” o seu, ou que na própria equipa existem colegas que talvez sejam um pouco melhores que ele, ou se pura e simplesmente o miúdo goste da bola mas devesse andar, por exemplo, no andebol, onde só precisa dos pés para correr…o culpado é o treinador! Porque não sabe treinar, não sabe jogar, não sabe armar tacticamente a equipa, não sabe fazer as substituições, o treinador é o culpado de tudo! Os valores de base são substituídos por a sede de vitória, e é triste o que se vê por vezes aos sábados de manhã nos campos do nosso distrito: um rol de pais e mães sedentos de se fazerem ouvir, preocupados unicamente com os seus, achincalhando-se mutuamente, incentivando à agressividade contra árbitros, adversários, etc, e ajudando a estragar por vezes o trabalho semanal dos treinadores, ao darem indicações aos miúdos, qual treinador, que cheios de medo de levarem 2 arrochadas ao chegar a casa e de ficarem sem Playstation no resto do fim de semana, lá fazem o que o pai lhe manda e deixam de ouvir o treinador. Esse desgraçado que perde 3 dias da semana com os miúdos. Dos outros. Que ao fim de semana muitas vezes faz as sandes para os filhos. Dos outros. Que ajuda a vestir a roupa e a calçar as chuteiras aos filhos. Dos outros. Que limpa o ranho e por vezes o rabiosque aos filhos. Dos outros. Sim, dos outros. Porque os seus estão em casa. Sem pai para brincarem, sem pai para lhes dar o pequeno almoço, sem pai para o ajudar nos trabalhos de casa, sem pai para brincar ao sábado de manhã. Porque o pai está com outros meninos. Com os filhos dos outros. E talvez a pensar: “Mas afinal, o burro não serei eu?”

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