sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Mário Elias

José Saúde

Vasculhando uma das gavetas de um armário que mantenho junto à minha secretária, recordei um rol de desenhos apoiados em crónicas desportivas alentejanas trazidas à estampa pelo saudoso Mário Elias, um mertolense que foi bolseiro da Gulbenkian e parceiro de tertúlias na clássica Lisboa com os seus amigos Herberto, Cesariny, entre outros confrades, aliás, um grupo onde se concentravam fidedignos intelectuais. A sua eloquente e literal mestria na escrita muito o ajudaram para desencantar antigos atletas do distrito de Beja. O tema, nesse tempo, era inserido nas páginas do extinto jornal “O ÁS”. Os textos, enriquecidos com excelentes desenhos, enobreciam personagens que ele citava com elevada proficiência. O Mário era um homem simples. Desarrumado, é verdade. Varão de um povo que muito o respeitava. Recusava entrar pelo interior de uma sociedade que ele intitulava de apodrecida. Corrompida. O seu anarquismo fez dele um senhor. Com ele passei horas a ouvir as suas coerentes ideias. Rejeitava o mundo da vaidade. As suas vestes anunciavam uma sincera humildade, não o conceito de avareza. Uma humildade que se traduzia numa gigantesca grandeza de espírito. O Mário era uma personalidade nobre. Pintor, jornalista e escritor foram hobbies que lhe preencheram a alma. Foi aquilo que quis ser. Abdicou de fatos de alta costura e de gravatas de seda. Não usou chapéus de aba larga, sapatos de marca requintada, esferográficas de etiqueta esmerada nem de explícitos compêndios onde expunha os seus artigos. Conhecemo-lo com calções, de camisas debutadas, um gorro de lã na cabeça, quer fizesse frio ou calor, cabelos esbranquiçados ao vento, uns chinelos enfiados nos pés e um maço de papéis desalinhados debaixo do braço que faziam parte do seu espólio literário. Olho para os seus ilustres desenhos onde retratava craques e revejo a dinâmica que o Mário impôs quando um dia se referiu ao seu pai, João Elias, um dos fundadores do Guadiana Foot-Ball Clube, no ano de 1926. A ilustração sensibilizou-me. A energia que o Mário incutiu na tela deu-lhe um maior talento quando contemplamos na parte superior do plano o castelo da vila de Mértola. Hoje, na orla do grande rio do sul é o Futebol Clube Guadiana, fundado em 1 de janeiro de 1947, que dá ênfase aos adeptos da bola na velhinha urbe. Recordando Mário Elias e as suas profícuas narrativas desportivas.

Fonte: http://da.ambaal.pt/

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