sábado, 24 de dezembro de 2011

Futebol. Poder Local e Desenvolvimento!

Quando, há uns anos, numa conversa que tive com um responsável do INATEL, que tinha iniciado funções havia pouco tempo, este me disse que, em sua opinião, havia um predomínio da actividade desportiva no distrito, em desfavor da cultural, tive oportunidade de, concordando com ele, não deixar de referir que, um reforço das actividades culturais, não poderia nunca pôr em causa a prática desportiva (em particular do futebol) que essa entidade proporciona, desde ainda antes do 25 de Abril, quando então se designava por FNAT.

Hoje, passados alguns anos, basta reflectir no que representa para as nossas aldeias e vilas, de Ficalho a Nave Redonda, ou de Sete a Mombeja, uma prova desportiva que movimenta mais de mil pessoas em cada fim de semana (entre jogadores, treinadores, dirigentes e árbitros), para se perceber a sua importância. 
Não só para os intervenientes mais directos (os jogadores) que, quer nesse jogos, quer nos treinos realizados desenvolvem um saudável exercício físico, aliado ao convivência e à amizade que esses momentos proporcionam, mas também para as populações dessas localidades onde, quinzenalmente, ao longo de alguns meses do ano, se disputam as partidas.
Não sendo, obviamente, uma verdade absoluta, não deixa de ser significativo que, frequentes vezes se apontem esses jogos como “a única coisa que faz mexer a aldeia”, pelo que, anualmente, um grupo de carolas faz com que seja possível que, com todas as dificuldades e, por vezes incompreensões, essa actividade “não morra”.
É claro que, como em qualquer outra competição desportiva, da mais profissional à mais amadora (como é esta), não deixa de haver as rivalidades, as disputas acesas e os “casos”, nomeadamente em torno das arbitragens.
Mas, descontando esses excessos (afinal, à imagem e semelhança dos dirigentes dos “grandes” do nosso futebol), não deixa de ser importante valorizar todos os que empenham, semana após semana, em proporcionar as melhores condições para a prática desportiva no nosso distrito. 
Sem esquecer que há também outros bons exemplos, quer no futebol a nível associativo e federado, quer nas mais variadas modalidades desportivas, a expansão e a consolidação desta prática, a nível do INATEL tem, a meu ver, duas explicações.
A primeira prende-se com o aumento e melhoria dos espaços desportivos, um pouco por todo o lado, que possibilitou, desse modo, que muitas crianças e jovens tivessem acesso, desde muito cedo ao desporto, de forma organizada e enquadrados tecnicamente (a segunda razão). São muitos desses jovens, já com uns anos de prática desportiva, os jogadores que compõem, anos mais tarde, as equipas das nossas aldeias. 
Sem ignorar, é claro que, em muitos casos, algumas das equipas recorrem a atletas de outras localidades e até de outras regiões geográficas, para poderem constituir o grupo. Em alguns casos, o número de habitantes de algumas dessas terras é de tal modo diminuto que seria praticamente impossível fazer uma equipa só com jogadores “da terra”.
Esta realidade, no campo desportivo é, na minha opinião, fruto também do desenvolvimento sociocultural que a democracia trouxe ao nosso País e, em particular à nossa região.
Numa altura em que, a pretexto da crise, se procura pôr em causa uma componente significativa da mudança verificada após o 25 de Abril – o Poder Local democrático ( ver o Correio Alentejo de 24 de Junho) - não é demais relembrar que, em 38 anos de democracia e de governos locais (nos Municípios e nas Freguesias), o muito que se fez para melhorar as condições de vida das populações.
No concelho de Beja, por exemplo, contavam-se pelos dedos das mãos as aldeias que tinham um campo de futebol com as condições mínimas para a prática dessa modalidade. Hoje em dia, praticamente todas as nossas freguesias dispõem de campos e, mais do que isso, de balneários e, em muitos casos, de electrificação. Não é, por isso, de estranhar que, na actual época desportiva, apenas em três das dezoito freguesias, não exista desporto organizado, o que não deixa de ser relevante.
Esse é, afinal, um pequeno exemplo da importância do Poder Local e da obra que foi realizada, um pouco por todo o Alentejo e por todo o País e que alguns governantes “iluminados” querem pôr em causa com a extinção, fusão, ou seja qual for o nome que lhe queiram dar, de algumas das nossas freguesias (o elo mais fraco, já que nos municípios não se atrevem a tocar).
Concluo, com um exercício de memória (talvez seja importante para alguns). Diz respeito à freguesia onde nasci, Santa Vitória, como poderia ser em relação a outra, de um qualquer concelho do nosso distrito Só alguém mal intencionado (ou míope) é capaz de ignorar a profunda mudança verificada, fruto do trabalho de autarcas da freguesia e do município, bem como dos habitantes locais.
A todos os níveis, essa mudança é visível, quer na sede da freguesia, quer na outra localidade, a Mina da Juliana. Desde logo, com o mais básico, o abastecimento domiciliário de água, o saneamento básico, a recolha do lixo (e, no caso da Mina, a luz eléctrica, que só aí chegou em 1976); as ruas e travessas completamente remodeladas; uma escola antiga, praticamente nova, com todas as condições de conforto e pedagógicas, para alunos e professores,  e que inclui um dos três parques infantis da freguesia; um posto médico, uma sede da junta de freguesia, um centro cultural e de convívio;  um centro de dia para os mais idosos, que dispõem igualmente de apoio domiciliário; o campo de futebol, balneários e luz artificial, com um polidesportivo também iluminado mesmo ao lado (junto á escola); a Casa do Povo beneficiada e que hoje acolhe os mais variados eventos, para toda a população; as viaturas que transportam doentes, os atletas, o grupo coral feminino, as crianças da Mina que se deslocam desde que a sua escola fechou.
Foi todo este esforço, humano e financeiro, feito ao longo destas quase quatro décadas que permitiu que casais jovens tenham optado por ali continuarem a viver, ainda que trabalhem, muitos deles, em Beja.
Por isso, quando uma escola encerra, quando o médico deixa de vir, quando os correios fecham, quando se ignora a componente social, cultural ou desportiva na vida das populações, ou como agora, se procuram extinguir freguesias, é todo este trabalho que é posto em causa, com as consequências nefastas que se observaram no último censo : o despovoamento, o envelhecimento, a desertificação.
É isso que devemos denunciar e que devemos recusar.

Cronica de José Filipe Murteira - Correio Alentejo ( 23/12/2011 )

Sem comentários:

Enviar um comentário