sexta-feira, 26 de outubro de 2012
Histórias de saudade
José Saúde
Divago no tempo e deparo-me com imagens que marcaram os verdes anos da minha juventude. Com um saco na mão - qual emigrante com uma mala de cartão pronto para desbravar fronteiras marcadas por vigilâncias imutáveis - eis-me, com 16 anos, a caminho de Lisboa. A tarde de agosto ia a meio. Perto das 17 horas caminhei à estação de caminhos de ferro, em Beja, onde apanhei o comboio que me transportou à capital. A “guia de marcha” indicava-me a apresentação no Sport Lisboa e Benfica. Para trás ficava o Despertar. Assim, depois de uma viagem carregada de sonhos e da travessia do Tejo – Barreiro/Lisboa de barco-, aportei no Terreiro do Paço, onde me aguardava o antigo jogador encarnado Ângelo, que me conduziu ao Lar do Benfica, na Calçada do Tojal. O Ângelo era, em 1967, o treinador da equipa de juvenis. Instalado no lar deparei-me com a inflexibilidade da disciplina interna. Ao sentar e ao levantar da mesa, almoço e jantar, havia uma regra de ouro: pedir licença ao jogador mais antigo. O Kiki, o Matine, o Malta da Silva, o Calado, entre outros, assumiam o comando das “operações”. E nós, putos, aceitávamos literalmente a norma. Depois vieram os treinos. Com o senhor Coluna, Eusébio, Simões, Cruz, Zé Torres, José Augusto, Jaime Graça, para além de uma panóplia de estrelas, comecei a aprender o abc do mundo da bola. Treinávamos em Pina Manique. O relvado da Luz estava em manutenção. Bebi, então, dicas nos bastidores que me levaram, depois, a caminho do Sporting. Hoje resvalo no desígnio das virtualidades que nos levam a conjeturar que o futebol é um desporto onde colhemos infindáveis ensinamentos que nos remetem para hilariantes histórias de saudade. Ficou a aprendizagem e a certeza que hoje já nada é como dantes, começando pelo estatuto dos craques.
Fonte: http://da.ambaal.pt
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