sexta-feira, 4 de abril de 2014
Uma velha glória do ciclismo
Nada acontece por acaso. O entusiasmo com que os almodovarenses vivem o ciclismo e a tradição que a modalidade tem na região têm um culpado – Manuel Caetanita, vencedor de uma etapa na Volta a Portugal.
Texto e foto Firmino Paixão
Corria o verão de 1976, estava bem fresca ainda a Revolução dos Cravos e a consolidação da democracia. Na estrada andava a 38.ª Volta a Portugal em Bicicleta, à moda antiga, daquelas que atravessava todo o território nacional, e essa, ganha por Firmino Bernardino com a camisola do Benfica, começou em Vilamoura e terminou em Lisboa. A 4.ª etapa, disputada em 20 de agosto, teve dois setores. O primeiro, com uma extensão de 135 quilómetros (o segundo foi um curto contrarrelógio de dois quilómetros em Sangalhos), correu-se entre a Sertã e a Mealhada e o vencedor foi Manuel Caetanita, um ciclista anónimo nascido em Almodôvar na véspera de Natal de 1952.
Correu três Voltas a Portugal, envergou a camisola do Louletano e rolou quilómetros ao lado das grandes figuras do ciclismo nacional. Hoje, com 61 anos, Caetanita assume a responsabilidade pela forma como a modalidade se enraizou na sua terra natal. Equipado a rigor e apoiado no quadro da bicicleta, depois de ter corrido a volta ao seu concelho, o carismático ciclista almodovarense assume: “O ciclismo preserva toda esta dinâmica em Almodôvar um pouco pela recordação do meu nome”. E lembra: “Dei muito nome a Almodôvar como ciclista, a modalidade ganhou aqui entusiasmo em meados da década de setenta com o falecido António Cândido Colaço, Armindo Barradas, João Silva, Francisco Revés e eu. Fomos a uma Volta a Portugal em 1976 e eu ganhei uma etapa e fui terceiro noutra”.
No seu palmarés guarda ainda os títulos de campeão regional e nacional de ciclocrosse, por isso, afirma: “A vila de Almodôvar é mais conhecida pelo ciclismo do que pelo futebol, sem que esteja a depreciar o futebol, mas o ciclismo aqui tem muita tradição”.
Mas como terão entrado as bicicletas na vida deste almodovarense? “Comecei no Louletano Desportos Clube. Estava a trabalhar numa oficina em Faro, como mecânico, ainda hoje tenho essa profissão, e puxaram-me para Loulé, viram que eu tinha qualidade e daí para a frente foi até correr na Volta a Portugal”.
O serviço militar travou-lhe a carreira. Esteve dois anos sem competir mas foi profissional e correu três Voltas a Portugal: “Uma pelo Louletano e duas pelo Almodôvar, primeiro pela Casa do Povo de Almodôvar e mais tarde pelo clube desportivo. Uma das voltas não conclui devido a uma queda”. E foi assim que Manuel Caetanita conheceu grandes figuras do ciclismo nacional: “Conheci o Agostinho, o Fernando Mendes, o Andrade, o Leonel Miranda, o Adelino Teixeira, muitas das grandes figuras do ciclismo nacional, mas convivi também com espanhóis que estiveram cá na Volta a Portugal em 73 numa equipa das Caves Messias, como o Jesus Manzaneque. Tiraram a Volta ao Joaquim Agostinho e depois ele foi para a França e quando voltou teve aquele acidente trágico que lhe provocou a morte”, conta com uma ponta de emoção e saudade.
Saudades? “Tenho, tenho muitas saudades e foi por isso que voltei a andar de bicicleta e a acompanhar os mais jovens, mas às vezes ainda encontro por aí malta do meu tempo”, assegura este homem bom, que diz: “Mantenho-me jovem e sempre com um espírito lutador”. Mas lembra também: “O tempo agora é para os mais jovens, há tempo para tudo, é depois é preciso desenvolver o desporto em Almodôvar, temos o município a apoiar, também as juntas de freguesia e o comércio local, é bom que a juventude veja esses exemplos e sinta vontade para praticar desporto e ter uma vida saudável”.
Mas o ciclismo hoje está diferente, recorda: “Desde logo pelos equipamentos, tínhamos camisolas de malha e camurça nos calções, tínhamos que as molhar porque não se aguentavam, não tinham nada a ver com o que se usa hoje. E a diferença entre as bicicletas nem se fala”, diz o ciclista que tem na Volta a Almodôvar a menina dos seus olhos: “Nem podia deixar de ser assim, no nosso país talvez não exista uma prova como esta, é muito dura”. Ainda assim, Manuel Caetanita vai manter a sua atividade competitiva, brevemente em Grândola (Circuito Jorge Nunes) e depois: “Farei algumas provas no sul de Espanha, vou com o meu filho, ele corre pelo Chão das Donas, de Portimão, e eu vou com ele”. Mas sem camisola de equipa e explica porquê: “A Casa do Benfica de Almodôvar é uma equipa de gente mais jovem, uma equipa ganhadora, com muita ambição, quanto fizeram a equipa chamaram-me, corri um ano com eles, mas eu já não acompanhava o ritmo deles, tentei ajudar o melhor possível para formarem a equipa, mas daí para cá nunca mais me disseram nada e corro a título individual apesar de ser benfiquista”. Nem mais! Um exemplo de que “velhos são os trapos”
Fonte: http://da.ambaal.pt/
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