João
Daniel Rico, o jovem treinador que liderou o histórico processo de
manutenção do clube no Campeonato de Portugal, continuará, na próxima
época, a liderar da equipa técnica, com objetivos bem definidos.
Texto Firmino Paixão
O objetivo principal, assumiu João Daniel, “é estabilizar o clube no
patamar nacional, crescendo, reestruturando e valorizando todo o seu
universo, ou seja, nivelando o Serpa pelos lugares mais acima para que o
clube continue a ribalta e seja falado no país, apesar de estarmos no
Campeonato de Portugal”. Quanto às escolhas para a próxima temporada,
deixou já perceber que “O plantel será ajustando, sem que se prevejam
muitas mexidas, porque, pela perceção que temos, todos os jogadores
gostariam de continuar no clube, algo que não é muito normal, e alguns
deles com convites para outro tipo de contextos a dizerem-nos ‘sou muito
feliz aqui e não quero ir embora’. Esta época deixou uma marca
emocional muito forte nos jogadores pelo respeito e carinho com que
foram tratados”, sublinhou João Daniel.
Já recuperou das emoções daquele minuto final do jogo entre o Serpa e o Barreirense?
Sim, o momento foi primeiro de tristeza, depois de alegria, logo a
seguir. Tristeza por ver o trabalho de toda uma época ir pela água
abaixo, uma época que não começou comigo, mas em que o trabalho de todos
concorreu para que conseguíssemos atingir o objetivo principal que o
clube tinha, a manutenção no Campeonato de Portugal. Sabíamos que ao
irmos para o último jogo ainda com as coisas em aberto, o adversário não
nos iria dar as coisas de mão beijada.
Marcaram primeiro e ficaram em vantagem, mas o empate até seria suficiente…
Marcámos um golo cedo, que nos podia ter tranquilizado, mas não
aconteceu. O adversário também fez pela vida, lutou muito e fez um bom
jogo. O empate seria um resultado justo e era esse o resultado que se
verificava aos 93 minutos, depois de o árbitro ter dado quatro minutos
de compensação. Tínhamos a posse da bola, perdemo-la, e o Barreirense
marcou o segundo golo, faltando não mais do que trinta segundos para
jogar. Fiquei sem reação ao ver o desespero dos nossos jogadores, passou
-me muita coisa pela cabeça. Enfim, naquele momento pensei que estaria
tudo acabado, mas os jogadores ainda acreditaram, tiveram fé, aliás,
superar situações adversas foi sempre o mote da nossa equipa. Veio
depois o lance final, em que o adversário comete o penálti e, sublinho a
frieza necessária do jogador que marcou a grande penalidade e repôs o
empate a nossa manutenção.
Vivências, momentos de incerteza e de múltiplas emoções, que contribuem para o crescimento de um treinador?
São momentos que nos marcam. Provavelmente se, no futuro, nos
deparamos com uma situação idêntica, já vamos ter aquela crença de
perceber que, enquanto o árbitro não apitar o jogo não acabou, esse é um
aspeto. O segundo, que é absolutamente ao contrário, será a
eventualidade de termos uma situação adversa em que toda a gente esteja a
pensar que estará consumada, termos que usar dessa determinação, dessa
vontade em virar as coisas a nosso favor. Mas isto não se conquista com
palavras, conquista-se com trabalho. Costuma dizer-se que a sorte dá
muito trabalho e eu acho que tivemos um pouco de sorte na forma como
conseguimos desenvolver aquele lance que nos dá o penálti e o golo.
Sobretudo porque os jogadores acreditaram…
Sim, tudo isso resulta de uma crença que os jogadores desenvolvem
dentro de si próprios, porque há momentos em que o treinador não é
ouvido, nem há palavras de motivação que possam mudar nada. Eles terão
que possuir essa crença, e os meus jogadores tinham-na. E porquê? Pela
forma, sempre em ascendente, com a parte final da época correu. Porque
perceberam que o clube tinha muito este objetivo, o clube precisa de
estabilizar nos campeonatos nacionais para possuir uma projeção
diferente no futuro. Perceberam que o clube nunca lhes falhou com o que
quer que fosse, tudo a tempo e horas, com uma organização ímpar, dentro
das contingências de um clube de uma região do interior. Disse-lhes
muitas vezes que, mais do que pensarmos em nós próprios, teríamos que
valorizar todo o esforço, todo o sacrifício, que as pessoas do clube
estavam a fazer para contribuírem para toda essa normalidade. E eles
sentiram necessidade de justificarem a aposta que o clube fizera neles
próprios, enquanto atletas do Serpa. Essa foi uma mensagem importante
que fomos sempre passando. E depois também olharmos para um estádio
cheio de adeptos a puxar por nós e a incentivar-nos. Ninguém ganha nada
sozinho.
Qual o fator que considera determinante para que a equipa tenha conseguido o objetivo?
O fator determinante foi fazer os jogadores acreditarem numa
mensagem. Quando cheguei, vi uma equipa desmoralizada, algo natural
quando não se consegue ganhar. Mas atenção que o Serpa chegou até à
quarta eliminatória da Taça de Portugal, portanto, é sempre de valorizar
o que foi feito anteriormente e não dizer que, com o João Daniel foi
uma coisa, e com a equipa técnica anterior, tinha sido tudo mau. Não!
Nada disso, não é esse o caso. Quando cheguei pedi que não pensássemos
já em vitórias, mas que pensássemos em ser competitivos, porque os bons
resultados seriam uma consequência disso mesmo. Isso foi acontecendo
progressivamente e esse foi o clique para os jogadores acreditarem mais
nas suas capacidades. Claro que tivemos alguns reforços que foram
importantes mas, em muitos jogos, oitenta por cento era a equipa que lá
estava desde o início da época. Os resultados foram aparecendo e, a
certa altura, todas as equipas começaram a olhar-nos de outra forma. A
equipa ganhou uma crença e um espírito de grupo fantástico e isso foi
realmente determinante.
O clube já anunciou a sua continuidade na próxima época desportiva. Se calhar, com alguns ajustes no plantel?
Sim, fechámos as coisas logo que a época terminou. Já havia uma ou
outra conversa informal a que eu não quis dar sequência enquanto as
coisas não estivessem definidas. Mas foi muito simples o consenso de que
todas as partes iriam ficar felizes, se continuássemos o projeto em
conjunto. A vida de treinador também tem momentos em que nos chegam
convites irrecusáveis, mas a direção do clube sabe que, se isso
acontecer, teremos que avaliar. Agora, o projeto do Serpa é aliciante,
naturalmente que teremos que possuir uma equipa competitiva. Não
queremos passar pelo sofrimento que aconteceu esta época.
Fonte: https://diariodoalentejo.pt/