João
Prates, 42 anos, treinador do Hajer FC, da Arábia Saudita, falou a A BOLA em
agosto, pouco depois de ter iniciado a sua aventura em terras estrangeiras.
Agora, seis meses depois, o português pode gabar-se de alguns feitos misturados
de… resistência.
Já vão
para oito os treinadores despedidos no Hajer FC, na equipa principal, nos
sub-23, nos sub-17, e até, na formação. A única equipa técnica que se mantém
intacta é a dos sub-20 do clube, ou seja, João Prates.
«Aqui
vive-se unicamente o momento e trabalha-se de impulsos, o que, por vezes,
dificulta o trabalho», desabafou o treinador luso que explica que um dos seus
colegas foi demitido apenas por ter somado dois empates em cinco jogos.
Além
do feito de resistir à imprevisibilidade do povo árabe, João já soma outros
factos de assinalar. De todas as equipas do Hajer FC, o plantel às suas ordens
é o único do clube que não está em posição de descida – encontra-se a meio da
tabela classificativa do campeonato.
«Sinto
alguma pressão porque na Arábia há aquilo a que chamam de ‘padrinhos’ (‘Wasta’,
em árabe) e há jogadores que têm alguma proteção, mas comigo quem não treina
não joga. Algumas situações tornam-se complicadas de gerir, contudo tento ser
justo nas minhas escolhas», admitiu o treinador português.
Em
dois jogos com o Al Ahly, líder do campeonato e clube de topo da Arábia
Saudita, o Hajer FC conseguiu somar quatro pontos, acontecimento que ainda
nenhuma outra equipa se pode regozijar de ter alcançado, visto que o Al Ahly
ainda não perdeu esta temporada. João mostra-se orgulhoso do desempenho e
prestação da equipa e acredita que o facto de ser português o tem ajudado a
fazer história além-fronteiras.
«Os
portugueses têm uma maior facilidade em se adaptarem a um novo meio, uma nova
cultura, uma nova mentalidade e isso foi-me muito útil. Primeiro é preciso
observar porque quem já treinou na Arábia Saudita sabe as dificuldades com que
se debateu. Mas desde o início que fui claro: quem não marca presença nos
treinos e treina o mínimo não tem hipótese de jogar. Depois tentei transmitir
aos jogadores aquilo que é a minha ideia de jogo. Apesar de sermos um clube
pequeno podemos vencer qualquer jogo, o que torna o treino mais atrativo para
os jogadores», receitou João Prates para a fórmula do sucesso que tem dito por
terras árabes.
O
treinador está agora a escrever um livro que relata a sua experiência, o que
sente quem deixa Portugal em busca de um sonho, as vitórias e os desafios pelos
quais passam os emigrantes.
«O meu
intuito é o de ajudar quem está ou vai estar na mesma situação que eu. Por
vezes, temos a ideia de que a vida é mais fácil do que aquilo que é. Vamos ao
desconhecido, sem nome, e por mais bem preparados que nos possamos sentir,
nunca o estaremos realmente, porque quando saímos da nossa zona de conforto
tudo tem um significado diferente. Vivemos coisas que jamais imaginaríamos»,
testemunhou João.
Relativamente
aos atentados de que a Arábia Saudita tem sido alvo nos últimos tempos e mais
especificamente a cidade onde João vive, Al Asha, o treinador mostra-se
receoso, mas tenta não estar focado em algo que não pode controlar.
«A
única coisa que desejo é não estar no local errado à hora errada e continuar
concentrado no meu trabalho. Causa-me receio, mas não posso mudar nada. Tento
ao máximo não pensar nisso, estando consciente de que algo pode acontecer»,
concluiu.
(Susana
Janota, A Bola)
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