sexta-feira, 2 de setembro de 2016

A saudade que fortalece


O avião que regressou do Brasil com os atletas olímpicos ainda voaria a grande altitude, entre o Rio de Janeiro e Lisboa, e já era grande a azáfama na sede do Clube Oriental de Pechão, onde a marchadora Ana Cabecinha e o seu treinador, Paulo Murta, seriam recebidos em festa.

Texto Firmino Paixão
Fotos Firmino Paixão/FPA

Muitos familiares, amigos, admiradores, dirigentes do clube, autarcas do Pechão e do município de Olhão, juntaram-se numa receção muito carinhosa à atleta, natural de Baleizão, há muitos anos radicada naquela freguesia. Todos quiseram saudar a protagonista do 6.º lugar na prova olímpica dos 20 quilómetros de marcha atlética, onde Ana Cabecinha conseguiu a melhor marca de sempre do atletismo português naquela disciplina. O “Diário do Alentejo” associou-se à carinhosa receção, onde não faltaram aplausos, brindes e algumas lágrimas. Se foram lágrimas de emoção, de alegria ou de orgulho, só Ana Cabecinha podia explicar: “Foi um pouco de tudo. Os Jogos Olímpicos foram o culminar de uma época muito complicada, com altos e baixos, treinava e abdicava de muita coisa e quando chegava às competições algum imprevisto sempre acontecia”.
A atleta lembrou também que “as coisas foram melhorando, mas ainda veio a situação dos Jogos Olímpicos em que não consegui aquecer por causa de uma lombalgia que me apareceu na noite anterior à competição, foi muito complicado gerir tudo isto. Por isso, vendo aqui as pessoas que mais gosto e mais amo, as emoções vêm mais à flor da pele”. Uma receção com muito significado e com o reconhecimento das entidades locais: “É sempre muito bom ser recebido desta forma e não é só de quatro em quatro anos. Em Pechão, nos outros anos, mesmo em campeonatos do mundo e campeonatos da Europa, tenho sempre a melhor receção ao chegar a esta ‘minha’ aldeia por esta minha gente que me viu crescer, tanto como mulher, mas também como atleta, e acarinhou-me a mim e à minha família. Claro que é sempre uma emoção muito grande ver estas pessoas aqui, têm orgulho na minha prestação e isso é fundamental para que eu me sinta feliz”.
No entanto, recordámos, existe outra aldeia e outra gente com quem gostará de festejar este percurso bem-sucedido. “Claro, acontecerá um dia destes. Sempre disse que a seguir aos Jogos iria passar uns dias ao Alentejo. Nunca esqueço a minha terra, as minhas raízes e as minhas gentes; posso estar aqui no Algarve há muitos anos, mas as pessoas sabem que sou alentejana, as rádios e a televisão já deixaram de se referir a mim como a atleta algarvia. É muito importante estar com as pessoas que me viram nascer e crescer, com os amigos dos meus pais e de toda a minha família, por isso é importante para mim ir a Baleizão. Já disse ao meu pai que irei ao Alentejo um fim de semana próximo”, prometeu.
Com tantas contrariedades, como referiu, o sexto lugar, melhor marca de sempre de uma atleta nacional na marcha atlética, tem o mesmo sabor de uma medalha: “Claro, penso sempre que quando algo me está consecutivamente a correr mal será porque alguma coisa boa me estará destinada. O 6.º lugar foi tirado a ferros, batalhei muito para chegar o mais longe possível, o 6.º lugar nuns Jogos Olímpicos tem um claro sabor a medalha”. Mais emotiva foi aquela imagem sobre o risco da meta com os indicadores e o olhar apontados ao céu. Estava ali presente a mãe Catarina: “Claro que estava e estará sempre porque cada ano que passamos sem ela é mais duro para nós, muitas pessoas pensam que a dor e a tristeza, até a saudade, se vão atenuando com o tempo, mas não, tem sido muito complicado e é nestes resultados que eu ainda sinto mais a sua falta. Lembro-me que em 2008, quando a tínhamos connosco, foi uma alegria chegar ao aeroporto e vê-la à minha espera. Claro que a sua ausência custa um bocadinho, é, e será sempre, por ela e pela sua memória que eu luto. Foi por ela que eu continuei. Em 2011, quando a minha mãe faleceu, pensei seriamente em abandonar a minha carreira, não quis mais fazer atletismo, levei ali muito tempo a lutar e as pessoas a insistirem comigo para regressar, mas houve ali muito tempo em que além duma lesão, era mesmo eu que não queria treinar, porque para mim já nada fazia sentido, mas é muito por ela que eu me mantenho aqui. Fiz-lhe uma promessa e vou continuar até conseguir o que lhe prometi”. 

Fonte: http://da.ambaal.pt

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