quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

A longa viagem de Malick Sambou!

Treze de Novembro de 2017, três da tarde, Penedo Gordo. Foi nesta pequena aldeia do concelho de Beja que Malick Sambou reencontrou a felicidade. Há mais de um ano que este jovem senegalês de 20 anos não participava num jogo oficial de futebol, mas quando entrou no campo pelado com a camisola do Praia de Milfontes pôde (finalmente) voltar a sorrir.
"Entrei em campo e parecia um jogador novo, foi muito bom para mim. Foi especial! No aquecimento só pensava: 'Hoje vou jogar, finalmente vou jogar'", recorda o atleta. "Digo sem vergonha que fiquei de lágrimas nos olhos quando ele entrou. Foi um momento especial", acrescenta António Friezas, vice-presidente do emblema de Vila Nova de Milfontes.
Mas para se perceber a importância daquela tarde de Novembro para Sambou (e para toda a equipa do Praia de Milfontes) é preciso recuar até Março de 2014, quando o jovem defesa central Malick aterrou em Lisboa proveniente da cidade senegalesa de Kolda. Na bagagem trazia roupa, umas botas e, sobretudo, o sonho de ser um craque na Europa do futebol, à imagem do ídolo (e compatriota) El Hadji Diouf.
Sambou chegou a Portugal para jogar nos juniores do Oeiras, mas a realidade que encontrou foi bem distinta daquela que lhe prometeram ainda em África. Durante alguns meses dormiu debaixo da bancada do estádio onde jogava e quando estava em vias de assinar contrato profissional com o clube partiu um pé. De imediato deixou de ter interesse. E quando se viu sem contrato e sem visto para continuar em Portugal, a solução foi... fugir! "Pensei que se voltasse ao meu país não conseguiria voltar à Europa. Não podia aceitar isso", conta ao "SW".
Foi então que em Agosto de 2015 rumou a Sines, para trabalhar nas obras. E aí tentou novamente a sua sorte. "Fui treinar umas vezes ao Vasco da Gama de Sines, mas eles não conseguiram resolver a minha situação", lembra Sambou. O senegalês continuava sem clube, mas teve a sorte de os dirigentes do emblema sineense contactarem o vice-presidente do Praia de Milfontes. Semanas depois já estava em Vila Nova de Milfontes.
"Começou a vir treinar cá e rapidamente percebemos que para inscrevê-lo como jogador seria muito complicado e não tínhamos a certeza de vir a consegui-lo. Mas ficámos impressionados com a história de vida dele e não conseguimos ficar indiferentes. E então a partir daí começou a ser um de nós, passou a pertencer à família Praia de Milfontes e começámos a criar condições para ele ter uma vida digna, ser auto-suficiente e não depender de ninguém", conta António Friezas.

"Uma pessoa especial"
Mas desde que chegou a Vila Nova de Milfontes até ao dia em que se estreou com a camisola do Praia, Sambou teve de aguardar até estar legalizado em Portugal. Uma espera que levou mais de um ano e que exigiu paciência e muita obstinação. "Foram tempos muito difíceis. Hoje um dia é muito difícil viver sem papéis, não se pode fazer nada… Não posso jogar à bola, não posso trabalhar. Mas agora está tudo resolvido, graça aqui ao vice-presidente do Milfontes", diz de sorriso largo.
Ao lado, António Friezas recorda a "guerra com a burocracia" que teve de travar em nome do amigo Malick. "Perdemos a conta às vezes que fomos a Beja. E de cada vez chegávamos a ir quatro ou cinco vezes à Segurança Social, outras tantas ao SEF e não saíamos do mesmo sítio. Mas nunca desistimos", diz. "A sorte do Sambou é ele ser uma pessoa especial e ser genuíno. Hoje, felizmente, está junto de nós e consegue fazer o que mais gosta, que é jogar futebol", acrescenta.
Malick Sambou volta a sorrir. "Aqui toda a gente gosta de mim. Parece a minha terra no Senegal, toda a gente fala comigo e gosta de mim. É uma terra muito fixe, muito boa. Sinto que aqui é a minha terra. É o melhor sítio de Portugal", diz o atleta senegalês, que também não poupa nos elogios aos colegas de equipa. "São todos boas pessoas, parece a minha família… Sinto-me mesmo muito bem aqui".
Fora do futebol, Sambou trabalha numa empresa de plantas decorativas e até já tem a sua própria casa. Para trás ficaram os maus momentos. Tão maus que nem sequer ousou contar à mãe e à restante família, que ainda está no Senegal. "Eles não sabem a minha história. E quando voltar ao Senegal é já com outra vida, muito diferente da que tinha", promete.
Mas tudo o que já passou em Portugal ficará para sempre na sua memória. Marcas que ajudaram a moldar os sonhos que Sambou alimenta no presente. "Agora só quero ajudar o Praia de Milfontes a estar em cima. Não sou um grande jogador, mas vou fazer tudo para o Milfontes estar em cima".

Fonte:  http://www.jornalsudoeste.com

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