sexta-feira, 14 de junho de 2019

Bola de trapos, edição de 14 de junho de 2019 no Diário do Alentejo

José Saúde
“Zunzuns das Portas de Mértola”
“Zunzuns das Portas de Mértola” foi uma coluna que o saudoso jornalista José Moedas debitou outrora no “Diário do Alentejo”. O conteúdo da narrativa apresentava-se impregnada em bisbilhotices e a sua sagacidade revelava uma observação ponderada numa cidade, Beja, que vivia sob o horóscopo do despotismo. O malabarismo com o qual o Zé Moedas trabalhava a circunstância da prosa, consolidava-se como obra de mestre. Comentava-se que a sua redação, fora do jornal, era a Ginjinha, defronte à “meia laranja”, um café localizado em pleno coração da velha Pax Júlia. Dizia o povo que o senhor Secundino, proprietário do espaço, seria um dos seus fiéis colaboradores. Uma dica aqui e uma outra acolá, servia a preceito as intenções do exímio fazedor de histórias para debitar no papel uma esplêndida notícia. Sentado a uma mesa do exíguo lugar, e deliciando-se com uma carocha, bebida que deixava o mais incauto cliente boquiaberto, o Zé, sempre de ouvido à escuta ao falatório de gentes que chegavam e outros que partiam, lançava o gracejo ao senhor Secundino, sendo que este, com a resposta à ponta da língua, gizava de pronto as traves mestras para uma salutar divulgação. A Ginjinha era um dos ícones onde as tertúlias desportivas amiúde ocorriam. Rebobinando a cassete de um filme que teima em permanecer ativo em usadas memórias, recorde-se que nesses tempos não havia jornais desportivos diários e nem tão-pouco rádios locais que possibilitassem a difusão da novidade. Neste contexto, as notícias desportivas imaginadas pelo Zé Moedas na sua coluna, “Zunzuns das Portas de Mértola”, eram a fina flor para o leitor que absorvia as eloquentes dicas. Claro que nem tudo se apresentava como real, uma vez que o divino criador socorria-se de pequenas sugestões levadas por aqueles que ouviam um conto e logo lhe acrescentavam mais um ponto. Nesta fase do ano, intitulada de defeso, as transferências de atletas era o pão nosso de cada dia. Fazendo menção à sua brilhante sabedoria jornalística, lá ia atirando para a praça pública eventuais aquisições para o Desportivo de Beja, clube que nessas épocas detinha a hegemonia do futebol na região. Em princípios da década de 1960 o Zé Moedas foi, à socapa, técnico do Desportivo quando a equipa militava na segunda divisão nacional, sendo que novidade não chegou a ocupar espaço nos seus utópicos e paradigmáticos “Zunzuns”. A fugaz boa nova não andou de boca em boca, restringiu-se ao balneário e à sala de reuniões da direção. Peritos no futebol afirmavam que o Zé Moedas era um profundo conhecedor da componente tática. E foi com este dote que assumiu a efémera condição de treinador. Registe-se a bem-aventurada devoção que José Moedas prestou ao jornalismo desportivo bejense e à escola deixada para os vindouros escribas que usufruíram da sua exemplar experiência.
Fonte: Facebook de Jose saude.

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