domingo, 18 de agosto de 2019

Bola de trapos, edição de 16 de agosto de 2019 no Diário do Alentejo

José Saúde
A Floresta
Nas calendas desportivas bejenses existem ícones do passado que nos remetem para insuperáveis momentos de saudade. De entre as diversas tertúlias dantes existentes em Beja, cidade onde o fenómeno desportivo ditava ordem nas longas conversas de amigos, permanece a extinta Floresta. Num baú já consumido pelo teor do tempo, estaciono o conteúdo da razão num espantoso parque de impressionabilidades e revejo lugares nos quais usufrui do prazer em ouvir gentes adultas que se entregavam de corpo e alma à maravilha de uma modalidade com a qual pelejavam no seu quotidiano. Insiro no faustoso leque de memórias a vivência diária que a Floresta proporcionava a homens que faziam do local um dos seus vitais pontos de encontro. Situada na Rua Frei Manuel Cenáculo, artéria conhecida como “ladeira da estação”, a Floresta, localizada defronte ao Jardim Público e inserida numa zona onde a consistência da columbofilia era imensa, foi ao largo de décadas um recanto para o câmbio de exequíveis tertúlias desportivas. Gerida pelo saudoso José Batista, pai do Zeca e do Rui “Moca”, rapazes que atuaram nas camadas jovens do Desportivo de Beja, a Floresta recomendava-se não só pela sua deliciosa gastronomia mas pela profícua cavaqueira sobre as últimas novidades postas a circular num burgo que ansiosamente se mostrava carente de notícias frescas. A afluência de jogadores, dirigentes e admiradores dos clubes então existentes, Desportivo e Despertar, era normalmente suportada por uma linhagem de pessoas que à volta de uma mesa dissecavam o quão importante era a mística que cada um deliberadamente partilhava. Pela mítica Floresta passaram craques que constantemente impunham uma ida ao local de “culto” onde eram recebidos com dignidade e sobretudo com a altivez que a sua presença incutia na plebe. Naquele tempo, e falemos concretamente dos anos de 1950, 1960 e 1970, porque nesses períodos cíveis éramos uns simples catraios, tivemos o prazer em frequentar aquele prodigioso espaço. Recordo, com extremosa saudade, aquando juvenil do Despertar a malta, meados dos anos 60, após receber os prémios de jogo (3$50 ou 5$00) juntarmos a maquia e lá íamos nós a caminho daquele lendário lugar para saborear o afamado feijão com dobrada regada com um jarro de vinho e uma gasosa. A correlação de amizades adquiridas entre o proprietário e os jogadores do Desportivo, levou, em algumas ocasiões, o patrão ofertar uma refeição quando o emblemático grémio jogava em casa. A fama da Floresta galgou fronteiras e houve até equipas forasteiras que marcavam uma refeição para os seus atletas naquela simbólica casa de pasto. Atualmente da Floresta resta uma elementar nostalgia e um metafórico adeus a um cosmos desportivo que gerou outrora saudáveis momentos de genuína amizade.
Fonte: Facebook de Jose Saude.

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