José Saúde
Balneário
A impressionabilidade daqueles que dantes partilhavam o balneário, local onde se cruzavam diversas conversas, foi, e é ainda hoje, um lugar supremo de elevadas crenças emocionais. Conheci os cheiros inalados de vestuários, no contexto do futebol, e a irrefutável realidade que constatei ao largo de vários anos, traz-me à memória companheiros, de entre outros intervenientes que faziam parte desse erudito lugar. No Despertar, em Beja, recordo, enquanto juvenil, o saudoso “tio” Cambado, o roupeiro que estava sempre pronto para satisfazer as nossas exigências, não obstante o seu semblante evidenciar, por vezes, um certo mau humor. Mas o “tio” Cambado, embora circunstancialmente amargurado com a vida, não rejeitava um pedido que lhe era solicitado. Após os treinos e jogos, arrecadava os equipamentos, lavava-os à mão, estendia-os num arame, umas vezes por baixo das arcadas do estádio municipal Dr. Flávio dos Santos, outras defronte ao balneário, quando o sol brilhava, mas este suportado com estacas em madeira, e à hora do treino tudo se apresentava em condições para se iniciarem as sessões de trabalho. Já como sénior tive o grato prazer em conhecer o balneário do Desportivo de Beja. Recordo como fui recebido, com 18 anos, e apadrinhado pelo grupo, sendo o Nói Alves, guarda-redes, um dos meus enormes companheiros. Equipávamo-nos lado a lado e esta amizade resvalou para o tratamento comum de compadre. Aliás, foi assim, como compadre, que nos tratávamos enquanto durou a sua vivência neste planeta Terra. No Desportivo houve uma personagem que cativava eufoticamente o balneário: o Baiôa. O Baiôa era um excelente contador de histórias. Um homem de negócios. Vendia roupa e relógios. Um dia, no balneário, encomendámos-lhe peúgas e outras peças de vestuário vindas do Egipto, sinalizando, de pronto, o material pedido. Só que a encomenda não havia meio de chegar e uma tarde perguntámos qual a razão da demora. Resposta pronta deste ilustre mertolense: “Malta, o barco que transportava o carregamento ficou apreendido no Canal Suez e a entrega vai demorar”. Concluindo: o dinheiro que serviu de sinal, e que entrou nos bolsos do Baiôa, jamais fora restituído, nem tão-pouco recompensado. Num jogo em Évora, quando Suarez era o nosso mister, defrontámos o Juventude e houve um lance em que eu, lateral direito, ia dividir a bola com um adversário, mas o Baiôa antecipou-se e no choque com o opositor fraturou um osso do pé. No regresso a Beja fomos dar os
parabéns
ao nosso companheiro João Caixinha que tinha casado nesse dia e dedicar-lhe a vitória (1-0). A boda teve lugar na quinta do Visconde, Boavista, e o Baiôa, mesmo coxo, “desviou” um peru assado da “mesa real” e lá o transportou debaixo da sua gabardine branca, ficando a promessa que a ave seria comida na terça-feira no balneário, após o treino. Aconteceu que o tal “passarinho” nunca chegou a aparecer. Eloquentes substâncias avulsas do antigamente que deixaram saudades!Fonte: Facebook de JOse Saude
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