O técnico bejense Francisco Agatão, 60 anos, é neste momento um treinador no desemprego. A última época, no Fontinhas, terá marcado a sua despedida da Ilha Terceira, senão mesmo da região açoriana, onde trabalhou quase 14 épocas desportivas, em quatro diferentes clubes.
Texto Firmino Paixão
Mas será que um treinador com o seu currículo irá passar a próxima época a ver futebol sentado no sofá? “Acredito que não”, garante Francisco Agatão. “Mas, no futebol, tudo é possível. É a primeira época em que estou de férias e sem trabalho”. O técnico não mostra preocupação, até pelo facto de, nos últimos anos, ter sido um dos melhores treinadores do Campeonato de Portugal e ter estado envolvido em projetos, ou mais do que isso, em sonhos de subida à II Liga. Mas assegura que ser treinador de futebol “é uma paixão” que continua a alimentar.
Terminado o Campeonato de Portugal o Francisco Agatão regressou a Beja, talvez para recarregar as baterias para os próximos desafios?
Regresso às minhas origens e, se calhar, de uma forma definitiva. Ainda não sei ao certo, mas a grande verdade é que, dado o facto de termos tido um ano muito difícil do ponto de vista social e desportivo, entendi que a minha ligação àquilo que foram os meus últimos cinco anos de vivência, na Ilha Terceira, finalizaram. Não terminaram da maneira que nós gostávamos, porque não conseguimos o apuramento para a III Liga, mas parece-me que todo o trabalho que realizámos esteve de acordo com aquilo que era expectável e exigido. Fica esse lamento de não termos conseguido entrar no ‘top’ cinco, mas não invalida que não me sinta feliz e realizado por tudo aquilo que foi feito.
E agora? Uma vez na sua terra natal, tem os seus momentos de reflexão, revê os familiares e convive nas tertúlias de amigos?
Vai por aí, revejo os amigos, pomos a conversa em dia… hoje em dia não podemos dar aquele abraço fraternal mas, naturalmente, que fico feliz por partilhar esses momentos, porque as amizades ficam para a vida, não são apenas momentos, são coisas duradouras e, quando nos reencontramos, sentimo-nos felizes.
Mas sente-se também feliz por ter sido um grande embaixador do Alentejo nos Açores?
Muito feliz! Quer como jogador, quer como treinador, tenho sempre demonstrado isso, nunca esquecendo as minhas origens e o facto de ter nascido no Alentejo, oriundo de uma família humilde, mas alguém que subiu a pulso, porque tudo o que conquistei na vida foi à custa do meu trabalho e tudo aquilo que tenho realizado, sobretudo na marca que deixo nos locais por onde passo em termos profissionais, fazem com que me sinta um profissional sério, competente e honesto. Naturalmente que associado a mim estará sempre a palavra Alentejo e a cidade de Beja em concreto. Sempre fiz questão de referir que gosto imenso dos Açores, que os considero a minha segunda casa, mas as minhas origens estão em Beja e aqui é que me sinto verdadeiramente feliz.
Por isso essa anunciada despedida dos Açores é uma verdadeira surpresa…
Sim, acaba por ser, quando nos sentimos parte de uma região, como é o caso, e muitas têm sido as mensagens que tenho recebido a perguntarem-me se este teria sido meu último ano nos Açores. Na Ilha Terceira foi com certeza. Sou um treinador desempregado, um treinador livre, aberto a tudo aquilo que sejam propostas e, dado o meu currículo, é natural que exista desejo de outras equipas, não só dos Açores, porque ali também deixámos um trabalho de propaganda do futebol açoriano. Mas quero ter a tranquilidade necessária para decidir o que será o melhor para mim e o melhor para o clube pelo qual eu optar.
A ascensão do Fontinhas tinha sido histórica e a sua manutenção no Campeonato de Portugal deu continuidade a essa história?
Fica-nos esse grande lamento de não termos conseguido entrar no lote dos primeiros cinco classificados da série, mas a conjugação de resultados, na última jornada, não o permitiu. Ao longo da época demos mostras da nossa competência, do nosso profissionalismo. Lamentavelmente não foi possível seguirmos em frente, mas fica para a história o sexto lugar, com os mesmos pontos do quarto, a melhor equipa açoriana no confronto das quatro, fizemos 11 pontos, 29 golos, nove vitórias, mais do que qualquer uma das outras, mas, infelizmente, não entrámos nos melhores cinco da série. Na Taça de Portugal atingimos a quarta eliminatória, depois de termos eliminado o Mafra, que era figura de destaque na II Liga. Portanto, parece-me que deixámos um legado de competência. No Fontinhas encontrei aquilo que deve ser a essência do futebol: diretores com uma dedicação e amor a um clube que é raro ver-se no futebol atual. Daí a minha tristeza por não lhe ter podido dar-lhes algo mais.
Mas foi uma saída pela porta maior…
Não foi pela porta que eu desejava que fosse, como é evidente. Seria muito melhor se tivesse sido com a disputa pelo acesso à III Liga, não sabendo, naturalmente, o que iria acontecer. Mas fica o registo de alguém que se dedicou com alma e coração em prol de um clube, à semelhança de todos aqueles, 17 ou 18, que já representei em toda a minha carreira.
Nesta altura é um treinador desempregado, mas com algumas propostas de trabalho?
Neste momento, nem tanto. Estamos numa fase em que as equipas ainda estão empenhadas nas fases finais e só a partir do final de maio poderão surgir algumas propostas. Mas também não estou muito preocupado com isso, sinceramente. Estou no seio dos meus familiares e dos meus amigos, querendo recompensá-los por todo o tempo em que estive ausente. Este ano, em 10 meses, apenas vim por três vezes a casa e isso, do ponto de vista emocional, foi muito curto.
Mas já merece um projeto com maior dimensão…
Já não ando à procura disso, aos 60 anos, não pela falta de atributos, mas sei que o futebol mudou, a competência e o profissionalismo ficam um pouco fora daquilo que são os interesses de clubes e de dirigentes. Não é uma crítica, é um facto. O que procuro é ter, todos os anos, um clube que me deseje e onde eu possa sentir-me profissionalmente recompensado.
Três dos quatro clubes alentejanos foram despromovidos aos regionais. Que leitura faz?
Uma leitura de que a região alentejana tem grandes dificuldades em manter as equipas num escalão mais acima, pelo menos no Campeonato de Portugal. No futebol, as coisas nem sempre correm da forma que nós desejamos e estamos numa região onde não existe muito investimento.
Fonte: https://diariodoalentejo.pt
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