José Saúde
O homem e a bicicleta
O contexto que acompanha a narrativa insere-se num recordar de homens que outrora fizeram do infindável prazer desportivo uma robusta montra onde se reveem enérgicas sensibilidades. No mundo desportivo do antigamente entrelaçaram-se laços de encantar que levaram o indivíduo a experimentar os mais díspares prazeres, sendo que o desfecho passava por participar num jogo de futebol. E é nesse âmbito que recorro, amiúde, a histórias de notáveis atletas que foram excelentes “artistas” no maravilhoso cosmos futebolístico. Falo-vos de Justino Baião, natural de Beja, nascido a 15 de dezembro de 1915, e que fez carreira no União. A vida de trabalho de Justino Baião foi marcada pela dureza do dia-a-dia, sendo que a sua aptidão para o futebol se iniciou em dérbis no largo do Carmo, um dos espaços prediletos, para além das eiras, à época, onde a miudagem se juntava e toca a dar chutos na bola, não obstante os preliminares cuidados que o polícia de giro impunha a jovens que deliravam com o gozo do vício do jogo. O saudoso jogador, atleta polivalente, mas atirando as suas características para jogar no setor recuado, a ‘back’, estreou-se nos infantis do Despertar, transitando, como sénior, para o União, agremiação que manteve, ao longo do tempo, uma luta persistente com o Luso. Um dia, o rapaz de Beja fora convidado para um jogo que se disputou em Moura, sendo que ele não rejeitou o convite e lá alinhou pela equipa do Atlético local. Pelo meio da viagem à terra de Salúquia, ficou uma aventura digna de registo: Justino Baião resolveu fazer o caminho, Beja-Moura-Beja, localidades distanciadas a 60 quilómetros, servindo-se de uma velha pedaleira, jogar os 90 minutos e regressar ao conforto do seu lar. Homem hirto com as suas convicções, foi um dos críticos aquando da fusão do Luso, União e Pax Júlia que deu origem à fundação do Desportivo de Beja, a 8 de setembro de 1947. Contava que o Luso tinha, nesses tempos, diretores de peso, como o Raul Lampreia e o Vicente Quinita, homens que mostravam dom de gestão e dominavam a área financeira. Justino Baião recordava que esteve perto de ser jogador do famoso Carcavelhinhos. Desmitificando esse convite, a antiga glória do passado, falava de uma transferência que esteve na iminência de acontecer: “Em Beja havia um senhor de nome Teixeira, gerente da Vacum, que falou com o seu gerente de Lisboa, o engenheiro Manso Preto, no sentido de eu ir para o Carcavelinhos, um clube que, nessa altura, era um dos maiores de Lisboa. Ainda lá fiz um treino e os exames médicos. Tudo estava acertado para ficar, mas depois fui-me embora”. Façanhas hilariantes, que me levaram a escolher o título “o homem e a bicicleta”, sabendo-se, no entanto, que viajamos pelo trilho de um antigo craque de futebol. Outros tempos e outras realidades de gentes que jogavam à bola simplesmente por amor à camisola!
Fonte: Facebook de Jose Saude.
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