Voltamos ao tema da motivação, do ânimo, da resiliência, tão necessárias todas elas se têm revelado para contrariarmos, senão, vencermos, os nossos medos, os nossos estados de ansiedade e de incerteza quanto à forma, e ao conteúdo, das estratégias para melhor encararmos o futuro.
Texto Firmino Paixão
A tempestade parece amainar, mas não é certo que lhe suceda a bonança. Aliás, este é um tempo em que não existem certezas de coisa nenhuma. Estamos a passar por um período de aprendizagem, de dúvidas, tudo, para além do momento que vivemos, agora e aqui, é desconhecido. Como se sairá disto? Como podemos encarar o amanhã, se até os que falam em nome da ciência dizem hoje uma coisa e amanhã o inverso? O primeiro caso de covid-19 em Portugal foi diagnosticado no dia 2 de março de 2020. Cerca de 13 meses depois, como estamos? Com economia quase em recessão, com o turismo, o desporto e a cultura em suspenso, o desemprego galopante, num processo de desconfinamento tímido, pelas tais incertezas do amanhã, com as escolas sem alunos, com os campos de futebol desertos e com as modalidades individuais à espera de retoma.
O Beja Atlético Clube, clube de topo deste distrito, na modalidade de atletismo, será talvez o emblema que mais afetado foi por esta pandemia, pelo vírus que além de ter atingido alguns dos seus atletas também limitou os objetivos e, sabe-se lá, impediu a concretização de alguns sonhos. Um ano depois, recupera-se lentamente a normalidade, mas, pelo caminho, certamente que ficaram algumas perdas, alguns momentos de possível glória que já não são possíveis de reversão.
O diretor desportivo do clube, Bento Palma, também ele um antigo atleta, deixa aqui uma síntese da sua visão dos acontecimentos: “Há um ano o impensável aconteceu. Tudo parou! Tudo se transformou num novo normal. Sem competições agendadas, começaram a surgir os primeiros sinais de desânimo entre os nossos atletas”. A seguir vieram as consequências que o dirigente aqui relata: “O desânimo trouxe a incerteza, a dúvida, a desmotivação a ansiedade, estávamos (e ainda estamos) perante um novo mundo, o mundo do desconhecido”.
Surgiram os primeiros sinais da crise emocional. “Alguns atletas até se questionaram com a sua continuidade na modalidade. Era e é difícil planear, metodicamente, o treino sem uma calendarização das competições”. O atletismo é, e Bento Palma sabe do que fala, uma “aprendizagem” para toda a vida. “Viver é renovarmo-nos a cada dia, reinventarmo-nos de todas as maneiras possíveis, superar os nossos próprios limites. Viver é arriscar, cair, levantar, prosseguir e nunca, mas nunca desistir”.
Já o dissemos, a desistência de metas, o abandono de perseguir o sonho, foi algo inevitável, um sentimento assim caracterizado por Bento Palma: “Corria o mês de março de 2020 quando o mundo e as competições desportivas fecharam portas, muitos atletas desistiram dos seus objetivos. O atletismo não foi, não é e nunca será uma modalidade fácil de praticar. O atletismo tem associado o sentimento de dor e todo o atleta sabe que a vai sentir no seu treino diário. Este desporto é para ‘guerreiros’ que se propõem vencer o seu próprio cansaço, os seus próprios medos e os seus próprios limites”.
Com a sua experiência adquirida no terreno, o diretor do clube acrescenta: “Todo o atleta é possuidor de características muito específicas, nomeadamente, a disciplina, a determinação e um espírito de sacrifício inabalável, associados a uma enorme paixão pelo atletismo, pelo amar correr e desfrutar da corrida. De entre as muitas restrições impostas por força da pandemia de covid-19, a legislação permitiu a prática do exercício físico, embora de forma isolada. O atletismo é uma modalidade que, na sua essência, é praticado individualmente”.
Por isso, foi delineada uma primeira estratégia. “Perante esta característica da modalidade, jogámos com os fatores intrínsecos, designadamente, dando continuidade ao treino regular, tendo sempre presente que, a partir do momento em que existisse algum tipo de competição estaríamos aptos a enfrentá-la”.
Ainda assim, houve que incentivar os atletas. “Para que este princípio permanecesse houve a necessidade de transmitir aos nossos atletas o espírito de resiliência, a fim de se superarem diariamente nas suas unidades de treino. Procurou-se sempre incutir-lhes a ideia de que deveriam de ser eles os adversários de si próprios, na busca da sua melhor versão, visto que é necessária muita coragem e determinação para eles conquistarem as metas, às quais se propuseram. O esforço é um investimento a longo prazo”.
Contudo, adianta Bento Palma, “por mais estranho que possa parecer há algo que os nossos atletas têm bem presente na sua mente: nada dura para sempre e, neste âmbito, integram-se as vitórias e as derrotas. Tudo acaba por mudar, por passar, eventualmente esta pandemia. O atleta, somente, precisa de acreditar, treinar e nunca desistir, pois quando há vontade, quando se acredita, tudo é possível e os sonhos tornam-se mais reais e passíveis de materializar. A persistência, a determinação, a superação ir-se-ão sobrepor a todo o sofrimento no processo evolutivo”.
A motivação, o estímulo, está dentro do próprio atleta, parece dizer o dirigente do clube. “Os atletas terão de encarar as dificuldades somente por aquilo que elas significam, ou seja, momentos difíceis, mas necessários, momentos de crescimento e aprendizagem e, muitas vezes, também oportunidades para mudar o que não estará bem quer na vida, quer no treino. Perante isto podemos afirmar que o treino é muito mais do que resistência, ele é também determinação, superação e resiliência que ajuda a desenvolver uma força inabalável e uma confiança indestrutível, acreditando sempre que sem sacrifício não poderão existir vitórias”. Mas há também os mais jovens, porque o Beja Atlético Clube tem uma enorme franja de meninos e meninas nas suas fileiras. Bento Palma conta que a escola de formação praticamente parou. “Esta é a situação que, de momento, consideramos mais preocupante, visto que é urgente agir, a fim de recuperar e desenvolver todo o potencial existente no Clube. Todavia, o clima de incerteza envolvente impede-nos de fazer qualquer programação a curto, médio e longo prazo”.
“Resta-nos, portanto, esperar o evoluir da situação epidemiológica e, certamente, quando estiveram reunidas as condições de saúde pública favoráveis para o regresso, tomaremos as decisões ajustadas ao momento. Porém, paira no ar o receio daquilo que muitos já apelidam de uma geração perdida”, conclui.
Fonte: https://diariodoalentejo.pt/
Sem comentários:
Enviar um comentário