Contou-me  um dia um amigo meu que na sua carreira de treinador a situação mais  caricata que lhe tinha sucedido foi um miúdo pedir-lhe para lhe limpar o  rabiosque, que na sua tenra idade e após o alívio antes do jogo começar  (fruto do tal nervoso miudinho que faz a tripa dar a volta) não tinha  tido tempo para chamar a mãe que nervosamente aguardava a saída do seu  Ronaldo para a estreia num campo de futebol. Os treinadores das camadas  jovens são os parentes pobres do nosso meio. Sem os holofotes da fama,  das rádios, dos jornais, fazem tantas vezes de pais, de tutores, de  formadores e de confidentes, de “professores” que ensinam não só a arte  do pontapé na chicha mas também transmitem as regras básicas da conduta  desportiva, do trabalho em equipa, do à vontade para tomar banho  mostrando o pirilau ao menino do lado, sem ter medo de ser gozado por  ter a “arma” mais pequena, gorda ou feia que o vizinho. Convivem os  treinadores de futebol juvenil também com outra área fundamental: os  paizinhos! Desde sempre os houve, desde sempre os haverá, e são por  vezes um grande apoio aos treinadores na ajuda em toda a formação cívica  de HOMENS que falámos atrás. Porém, outras vezes, são o grande  problema! Para um pai o seu filho é sempre o melhor, seja a jogar, seja a  cantar, seja a desenhar, seja a urinar com o arquinho mais alto, seja a  mandar o piropo mais giro à empregada do café da esquina ou tão  simplesmente a gozar com o amigo que é lagarto e não ganha a ninguém.  Não se preocupa em que o filho pratique desporto em vez de andar na má  vida, nem tão pouco lhe passa os valores de que nem sempre se pode  ganhar, jogar, que nem sempre se tem de culpar o árbitro pela derrota,  ou que terá de respeitar o vencedor da mesma forma que o deve fazer ao  vencido quando ganha. Preocupa-se em que o filho jogue sempre! E quando  não o faz o burro é o treinador! Não importa se do outro lado estão  miúdos maiores, já com barba, que em 3 passadas “papam” o seu, ou que na  própria equipa existem colegas que talvez sejam um pouco melhores que  ele, ou se pura e simplesmente o miúdo goste da bola mas devesse andar,  por exemplo, no andebol, onde só precisa dos pés para correr…o culpado é  o treinador! Porque não sabe treinar, não sabe jogar, não sabe armar  tacticamente a equipa, não sabe fazer as substituições, o treinador é o  culpado de tudo! Os valores de base são substituídos por a sede de  vitória, e é triste o que se vê por vezes aos sábados de manhã nos  campos do nosso distrito: um rol de pais e mães sedentos de se fazerem  ouvir, preocupados unicamente com os seus, achincalhando-se mutuamente,  incentivando à agressividade contra árbitros, adversários, etc, e  ajudando a estragar por vezes o trabalho semanal dos treinadores, ao  darem indicações aos miúdos, qual treinador, que cheios de medo de  levarem 2 arrochadas ao chegar a casa e de ficarem sem Playstation no  resto do fim de semana, lá fazem o que o pai lhe manda e deixam de ouvir  o treinador. Esse desgraçado que perde 3 dias da semana com os miúdos.  Dos outros. Que ao fim de semana muitas vezes faz as sandes para os  filhos. Dos outros. Que ajuda a vestir a roupa e a calçar as chuteiras  aos filhos. Dos outros. Que limpa o ranho e por vezes o rabiosque aos  filhos. Dos outros. Sim, dos outros. Porque os seus estão em casa. Sem  pai para brincarem, sem pai para lhes dar o pequeno almoço, sem pai para  o ajudar nos trabalhos de casa, sem pai para brincar ao sábado de  manhã. Porque o pai está com outros meninos. Com os filhos dos outros. E  talvez a pensar: “Mas afinal, o burro não serei eu?”
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