O universo da bola
Numa jornada ao global mundo futebolístico, vamos revendo histórias que
marcarão para sempre a nossa antiga rendição a um fenómeno ao qual
dedicámos uma fascinante entrega. Guardamos copiosamente no arcaico
alforge das luxuosas lembranças pequenas narrativas que contemplam os
tempos em que fomos ancestrais figurantes no encantador palco
desportivo, sendo também verdade que proporcionámos êxtase num público
que em redor do retângulo de jogo vivia intensamente o espetáculo da
bola. Tive, felizmente, oportunidade em conhecer dois antigos
companheiros, ambos guarda-redes, que nos seus tempos defenderam, com
decência, a sua posição entre os postes de clubes que outrora
representaram: o Nói Alves e o Titão. Curvo-me perante a sua eloquente
honradez quando, amiúde, trocavam “mimos” sobre a sua atuação entre os
postes e num lugar que brilhantemente defenderam. À baila da conversa
surgia, regularmente, o termo de “franganeiro”. O Alves, um companheiro
com o qual partilhei o balneário do Desportivo de Beja, picava o Titão,
antigo guardião do Alhandra e Olivais e Moscavide, verbalizando que
“nunca tinha jogado em Beja”, logo “era um desconhecido” na cidade que o
viu nascer. O Titão, pressupostamente arreliado pelas brincalhonas
dicas do seu velho amigo, virava-se para o Alves e atirava-lhe com esta
sua coroa de glória: “Não te esqueças que cheguei a jogar contra o
Eusébio logo no início da sua carreira no Benfica, portanto o meu
passado regista esse dado importante”. O Alves, com a sua velha calma,
respondia: “Está bem! Mas qual é o teu currículo como jogador?”. O
Titão, puxando de mais um cigarro e acendendo-o de mansinho, respondia:
“Joguei no Alhandra, segunda divisão nacional, em Moscavide e na
Alemanha”. E era sob este planeta de interessantes opiniões em que o
universo da bola é fértil, que passei momentos hilariantes ouvindo as
suas profícuas conversações. O Alves e o Titão foram dois amigos de
peito que preencheram as pressupostas clausuras de homens que fizeram do
desporto um hino às suas liberdades pessoais e obviamente desportivas.
Deles guardarei eternamente momentos de enlevo e de uma vasta dor pela
sua última viagem sem regresso. Morreu Mariano Martins Titão, 81 anos,
natural da freguesia de São João Batista, em Beja. Agora, já recolhidos
no perpétuo reino dos céus, resta-lhes a ficção ancestral do tempo para
um imaginado reencontro de profundas nostalgias e de um reavivar de
recordações, mas agora já definitivas no escrupuloso sepulcro dos
silêncios, mas onde o universo da bola terá sempre lugar em memórias
naqueles que por cá ficam. Pela vossa singela gentileza como me
acoitarem no vosso majestoso império terrestre, registo no meu cardápio o
comovente adeus destas duas perdas, o Alves já em tempos, e o Titão
recentemente. Resta, pois, recordá-los com uma sumptuosa saudade. Até
dia, companheiros!
Fonte: Facebook de Jose Saude
Fonte: Facebook de Jose Saude
Sem comentários:
Enviar um comentário